segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Aquários! Entretenimento?

Aquários! Entretenimento?(1)
Eduardo Dantas da Nóbrega Filho


O que é um aquário? A primeira idéia que geralmente vem à mente pode ser de um “depósito de água para conservar, criar ou observar animais ou plantas aquáticas” (2). Porém, o conceito de aquário está a muito distante da simples denominação encontrada em dicionários. Eles são um chamado permanente orientado a todos os tipos de pessoas para visitarem um mundo diferente, com lugares remotos, encontrando variados e diversos animais, num contexto de entretenimento e lazer. Se em apenas um simples aquário doméstico já podemos nos transformar em “anfíbios”, permitindo-nos uma movimentação fácil entre a água e a terra, a observação da vida à sua superfície e debaixo dela, e o usufruto da experiência de uma pré-imersão, o que poderemos dizer de tais edifícios onde a exposição é sua basilar substância?

O lazer relacionado como objetivo do aquário é uma importante temática que deve se baseia em certos critérios, ocasionando exigências de espaços e programas particulares como: caracterização do homem, de forma não a traduzir a divisão de classes em espaços, mas sim legitimar as diferenças entre as necessidades dos homens de acordo com sua faixa etária, expectativas, aspirações, comportamentos etc; caracterização funcional, já que o tempo livre proporciona uma variedade de objetivos a serem alcançados, indo de atividades culturais, comerciais, religiosas, até o puro divertimento e descanso físico-intelectual; caracterização do tempo, coincidindo o período de lazer com o período de viver humano, indicando um lazer horário ou ocasional.

O projeto e/ou desenho de equipamentos e áreas reservadas ao lazer, traduz o imaginário do próprio espaço mais geral do viver humano que, juntamente com o trabalho, efetivam a liberdade humana, aliados aos desígnios educacionais, bases sólidas para este e diversos outros temas relacionados. Exposições temporárias ou permanentes, além de atividades educacionais, proporcionam uma experiência incomparável no comando dos aquários. Edificações deste tipo possuem uma admirável função de divulgar a ambiência marinha, chamando seu papel essencial na saúde e evolução do planeta, despertando a responsabilidade em sua conservação e defesa em todos. Através da grande visão da vasta gama de seres vivos que habitam todos os nossos oceanos e da representação fiel do micro clima marinho, exalta-se também a vida na Terra. Em resumo, o conteúdo da exposição, a concepção arquitetônica e o seu funcionamento são os principais mecanismos que regem um centro marinho de tal qualidade.

Exemplos bem exemplares

O Rei de Portugal Dom Carlos I (3), primeiro oceanógrafo do mundo, ordenou a construção do Aquário Vasco da Gama, recolheu uma infinidade de espécies marinhas e aves e até desenhou sua idéia particular de exposição (4) (Fig. 01), numa época em que o vidro era fabricado apenas com poucos centímetros de espessura.

Figura 01

O Aquário Vasco da Gama foi inaugurado a 20 de maio de 1898, numa cerimônia de grande impacto público, na presença da Família Real e numerosas individualidades da época. Foi um dos primeiros aquários no mundo, sendo a sua construção ordenada pela Comissão Executiva da celebração do 4º Centenário da partida de Vasco da Gama para a viagem do descobrimento do Caminho Marítimo para a Índia. Na altura da inauguração, o Rei Dom Carlos I realizou numa das suas salas uma exposição com o material zoológico por ele recolhido nas campanhas oceanográficas de 1896 e 1897. Findas as festas das comemorações, ficou o Aquário sendo propriedade do Estado. Em Fevereiro de 1901, a sua administração foi entregue à Marinha, onde permanece até hoje como organismo cultural (5).

Figura 02

Ainda em Portugal, encontramos o Oceanário de Lisboa (6) (Fig. 02), bem mais moderno que o seu precursor, explorando todo um conceito de unidade dos mares e oceanos da Terra, transmitindo a importância de um pensamento global no que se refere ao Oceano e ao próprio planeta, numa visão integrada dos seus sistemas e recursos. Construído para servir como Pavilhão de Exposições da Expo’98 (7), hoje ele se transformou no principal Centro de Estudos Marinhos do país, servindo de exemplo e fonte de pesquisas para todo o mundo. Possui uma exposição bem variada, desde distintas espécies de peixes (Fig. 03), pingüins, pássaros, até uma grande variedade de espécies vegetais, cada um representando um ponto marcante do planeta (8).

Figura 03

Voltando-se à América, o projeto do Aquário Nacional, em Baltimore (EUA), construído sobre um píer, apresenta-se como o objeto de um concurso ganho pelo grupo Cambridge Seven e inaugurado em 1981 a um custo total de US$ 21 milhões (Fig. 04). O seu sucesso foi tão grande que a marca dos 400.000 a 600.000 visitantes/ano prevista em seu planejamento inicial foi superada logo nos sete meses após a inauguração, quando se atingiu um total de um milhão de visitantes. Sua construção é tida como a maior atração do estado e proporcionou uma grande geração de empregos durante sua execução. Projetado como um museu, com os tanques organizados em percursos educativos que culminam numa pirâmide de vidro com um grande jardim tropical no topo do edifício, em 1991 ganhou um anexo no píer vizinho, onde se localizou uma nova área de exposições e grande tanque com anfiteatro para shows aquáticos. São mais de oito mil espécies de peixes e mamíferos em exposição, ambientes recriando diversos ecossistemas e espetáculos aquáticos, numa atrativa e premiadíssima arquitetura. (9)

Figura 04

Diversos outros aquários (10) (Fig. 05) foram sendo construídos em todo o mundo, entrelaçando o conteúdo da exposição com a sua arquitetura, em resposta a um local urbano, e estabelecendo uma identidade e missão que nasceram de circunstâncias únicas. Exemplares estes desenvolvidos com características peculiares, tendo muito sucesso, tanto no âmbito da resposta do público a tal equipamento quanto na própria forma de manutenção e criação dos espécimes expostos.

Figura 05

Figura 06

No Brasil, podemos encontrar significativos modelos de equipamentos do tipo, tal como o Aquário de Ubatuba, em São Paulo, onde desde a sua inauguração em 1996, já recebeu mais de noventa mil (90.000) alunos de toda rede de ensino, pública e particular da região, de turmas maternais a universitários, sempre buscando atingir os ideais e princípios básicos da Educação Ambiental (11). O Aquário de Santos (Fig. 06), também em São Paulo, projeto do arquiteto Paulo Mendes da Rocha, também se tornou um ponto referencial de visitação, local de orgulho e atração turística tradicional da cidade, chegando a registrar em média seiscentos mil (600.000) visitantes por ano; além da exposição dos animais nos tanques distribuídos em todo o edifício, ele oferece também shows ao vivo em um anfiteatro para espetáculos aquáticos (12). No Nordeste temos o Oceanário de Aracaju (Fig. 07), inaugurado no ano de 2002, localizado na praia de Atalaia e administrado pela Fundação Pró-Tamar, sob coordenação do setor regional do Projeto Tamar-Ibama no Estado de Sergipe. Possui aquários e tanques de variados tamanhos, incluindo um onde se é permitido contato com certas espécies (Fig. 08), além de laboratórios para manutenção e suporte, um pequeno anfiteatro, projeção de vídeo, painéis informativos, mostruários com exposições constantes sobre o mangue e fósseis de tartarugas (Fig. 09), peixes e até de uma alga calcária, com cerca de 110 milhões de anos.

Figura 07

Figura 08

Figura 09

As diretrizes de todas estas as edificações do tipo (e de tantas outras existentes) foram ajustadas tendo como foco o incremento local e/ou regional, em busca da concepção de oportunidades e melhores condições de vida para as populações relacionadas, mobilizando a participação popular e a construção da cidadania.


NOTAS:
1
Este artigo é uma versão particular baseada em:
NÓBREGA FILHO, E. D. Aquário! Centro Aquático de Exposição e Educação Ambiental. Trabalho Final de Graduação. Universidade Federal da Paraíba - UFPB. João Pessoa, Paraíba, BRASIL, 2003.

2
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da Língua Portuguesa. 3a. edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

3
“Dom Carlos I, de seu nome completo Carlos Fernando Luís Maria Victor Miguel Rafael Gabriel Gonzaga Xavier Francisco de Assis José Simão de Bragança Sabóia Bourbon e Saxe-Coburgo-Gota, (Palácio da Ajuda, Lisboa, 28 de Setembro de 1863 - Praça do Comércio, 1 de Fevereiro de 1908) foi o penúltimo Rei de Portugal.” . Acessado em 18/05/2008.

4
AQUANARIUM. . Acessado em 07/12/2002.

5
Aquário Vasco da Gama. . Acessado em 02/05/2008.

6
Efetivamente não há diferença entre oceanário e aquário. Um oceanário pode ser elucidado como sendo um aquário de água salgada, onde se fala mais profundamente sobre os Oceanos (daí o neologismo Oceanário).

7
“Motivados pela poluição que ameaça gravemente a saúde dos oceanos, e devido à sobreexploração de recursos, em terra e no mar, os fundadores da Expo’98 planearam construir um aquário. Este deveria manter viva a mensagem da Expo‘98 e, ao mesmo tempo aumentar a oferta cultural e educacional do país. Assim nasceu o Oceanário de Lisboa, um aquário gigante totalmente dedicado aos oceanos e à sua conservação.” . Acessado em 18/05/2008.

8
Grupo Parque Expo. Oceanário de Lisboa, S.A. Pavilhão dos Oceanos: Exposição Mundial de Lisboa de 1998 – Expo’ 98. Catálogo Oficial. Lisboa, PORTUGAL, 1998.

9
DEL RIO, Vicente. Voltando às origens. A revitalização de áreas portuárias nos centros urbanos. www.vitruvius.com.br. Arquitextos, n. 015 e 091. São Paulo, Portal Vitruvius, agosto 2001. . Acessado em 02/05/2008.

10
Citando exemplos estimáveis: Aquário Kaiyukan de Osaka (www.kaiyukan.com/), no Japão, inaugurado em 1990; Aquário de Gênova, na Itália (www.acquariodigenova.it/); Monterey Bay Aquarium, na Califórnia, EUA (www.mbayaq.org/); Aquário de Cuba, fundado em janeiro de 1960 (www.acuarionacional.cu/).

11
Princípios da Educação Ambiental: de acordo com a Lei n° 9.795, de 27 de abril de 1999, aprovada pelo Congresso Nacional Brasileiro, do Ministério do Meio Ambiente “entendem-se por Educação Ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.” . Acessado em 02/05/2008.

12
WOLF, José. Aquário Municipal de Santos: Uma Paisagem Marinha. Revista AU - Arquitetura e Urbanismo. São Paulo, n° 42, p. 42-47, Jun./Jul. 1992.


LEGENDAS DAS IMAGENS:
Fig. 01 – Aquarela de D. Carlos I expressando a sua idéia de um aquário. Fonte: www.aquanarium.kit.net

Fig. 02 – Oceanário de Lisboa, PORTUGAL © Foto Carla Robalo Martins. Fonte: www.oceanario.pt

Fig. 03 – Tubarão-touro (Carcharias taurus); Oceanário de Lisboa, PORTUGAL © Foto Abílio Leitão. Fonte: www.oceanario.pt

Fig. 04 – Aquário de Baltimore, EUA. Fonte: www.baltimore.to

Fig. 05 – Monterey Bay Aquarium, Califórnia, EUA. Fonte: http://outdoors.webshots.com/

Fig. 06 – Maquete do Aquário de Santos. Fonte: Revista AU – n° 42 / Jun-Jul 1992.

Fig. 07 – Vista geral externa. Oceanário de Aracaju, SE - BRASIL. Fonte: arquivo pessoal do autor, 2006.

Fig. 08 – Tanque de contato - Tubarão-lixa (Ginglymostoma cirratum). Oceanário de Aracaju, SE - BRASIL. Fonte: arquivo pessoal do autor, 2006.

Fig. 09 – Fósseis de animais em exposição. Oceanário de Aracaju, SE - BRASIL. Fonte: arquivo pessoal do autor, 2006.

sábado, 17 de outubro de 2009

Complexo Urbanístico Shehrey-Azam

Complexo urbanístico localizado na cidade de Islamabad, capital do Paquistão, Ásia. A proposta foi realizar o empreendimento em uma área de 50 acres do governo local em troca do desenvolvimento da mesma, com diversos equipamentos, tais como um estádio de críquete (esporte mais popular do país), uma grande área residencial com edifícios multifamiliares, shopping center e restaurantes, tornando a região um importante centro econômico da cidade. Diversos esboços de setorização foram feitos para que se pudesse permitir uma melhor integração dos usos tão variados como os citados, além de outros estudos como o de massa e viabilidades relacionadas a cada tipo de edificação locada em cada setor.

Localização

Estudos volumétricos

Legenda: AZUL (residencial), VERDE abaixo (hotel), VERDE acima (LAZER), BRANCO (estádio de críquete), MAGENTA (comércio), AMARELO (shopping center).



Ficha Técnica:

Urbanismo: Eduardo Dantas, Ricardo Vidal e Leonardo Tavares.
Local: Islamabad, Paquistão, Ásia.
Ano do Projeto: 2007
Imagens: Leonardo Tavares.



quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A surpresa chamada Bolívia

A Bolívia pode não ser um destino tão procurado por turistas, mas superou todas as minhas expectativas. País simples, de gente hospitaleira, humilde e muito patriota, de belezas naturais maravilhosas e tão pouco conhecidas, possui duas capitais: La Paz e Sucre (capitais administrativa e jurídica, respectivamente).

Catedral de Sucre

Madrugada do dia 11 de outubro de 2008. Pousamos em Santa Cruz de la Sierra, logo após o fim das manifestações que afligiram o país em meados de setembro, onde alguns departamentos – estados bolivianos – realizaram conflitos contra o Presidente Evo Morales, bloqueando estradas, invadindo empresas estatais e até fechando as fronteiras com países vizinhos. Mesmo com as notícias não muito aprazíveis, nos últimos dias de organização para a viagem, seguimos em frente com os planos e tivemos uma enorme e agradável surpresa.

Apesar de ser uma grande cidade, Santa Cruz de La Sierra se apresenta como um lugar ordeiro, com uma população com fortes influências incas e de outros povos indígenas que os antecederam, tanto no vestuário quanto na música, e até mesmo na religião (mesmo o cristianismo, trazido pelos espanhóis, sendo a maioria atualmente). O destaque local é a Basílica Menor de San Lorenzo Martir, que desde 2004 é Patrimônio Monumental Histórico e Cultural, símbolo mais importante da cidade, não só a nível histórico, mas também artístico, arquitetônico e religioso.

Basílica Menor de San Lorenzo Martir

Basílica Menor de San Lorenzo Martir

De Santa Cruz fomos a Sucre, conhecida como a cidade branca das Américas. Declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO, em 1991, possui belos exemplares de arquitetura religiosa, casarões coloniais, importantes museus e primorosas praças, como a principal, 25 de maio, data da primeira proclamação de independência do país, em 1809 (apesar da República da Bolívia nascer apenas em 1825, depois de outros conflitos).

Após várias horas de ônibus nada confortáveis, chegamos a Potosí. Destacada cidade boliviana por causa da exploração mineral em sua história (principalmente da prata) possui um vasto patrimônio arquitetônico, onde pode ser destacado o Museu Casa da Moeda. Imponente edifício de dois pisos, várias salas e três grandes pátios internos, além de local para fundição do dinheiro, foi usado em outras ocasiões como presídio e quartel.

Museu Casa da Moeda

Museu Casa da Moeda

De Potosí partimos para Uyuni, cidade próxima do maior deserto de sal do mundo – o Salar de Uyuni – com aproximadamente 12.000km² de área. Uma imensidão branca, onde a perspectiva visual engana e óculos escuros são fundamentais. Nele encontramos algumas edificações feitas de sal, como casas, pequenas lojas e hotéis quase inteiramente de sal (paredes, piso, mobiliário etc). Em seguida fomos a La Paz, capital mais conhecida e cidade mais populosa de todo o país. Está entre um vale profundo rodeado por montanhas e montes de grande altitude pertencentes à Cordilheira dos Andes e vales mais baixos. A cidade cresceu por cima de toda esta malha.

Salar de Uyuni

Hotel de sal no Salar de Uyuni

Dentre os maiores atrativos turísticos locais e circunvizinhos se destacam o Vale de La Luna, o Sítio arqueológico de Tiwanaku (civilização pré-inca), a Praça das Armas e o Monte Chacaltaya, onde está a mais alta estação de esqui do mundo. Por fim visitamos ainda as cidades de Cochabamba e Copacabana, esta última às margens do Lago Titicaca, o maior e mais alto lago navegável do mundo, com cerca de 8550m² de superfície, a mais de 3800m acima do nível do mar.


Monte Chacaltaya

Lago Titicaca

Lago Titicaca

Copacabana, cidade às margens do Lago Titicaca

Ficha Técnica:
Artigo publicado pela revista Artestudio - arquitetura, decoração e estilo de vida, n° 25, pags. 68 e 69, ano VII, mar/abr/maio 2009. João Pessoa, Paraíba, Brasil (www.artestudiorevista.com.br
).
Texto e Fotos: Eduardo Dantas.
Entrevista: Programa Artestudio TV (fonte Youtube)